terça-feira, 11 de dezembro de 2018

A persistência da pobreza (e ainda alguns tropeços)


Recentemente, leu-se notícias sobre estatísticas de aumento da pobreza no Brasil. Notícias sobre o tema são recorrentes, e qualquer revisão rapidamente localiza um passado destas tristes notas.
Mas no concentremos aqui num ponto, que tem exata relação com o colapso (e este é o termo) que enfrentamos desde 2014, com crescimento do PIB de 0,5% em relação a 2013, (para/contra um crescimento da população de aproximadamente 0,7 a 0,8%) e um déficit público inédito da escala de dezenas de bilhões de reais, atingindo, pois, fração que se aproximava de 1% do PIB, e posteriormente, piorando, apesar de nossa brutal carga tributária.

Uma nota rápida: na verdade, pela evolução da dívida pública, nossa situação de contas públicas nunca ficou realmente “boa”.




A pressão do crédito, pela e-nésima vez

Apontei - na verdade, humildemente, demonstrei - no meu artigo mais formal sobre "pressões" econômicas que nossa “pressão” causada pelo crédito atingia valores intoleráveis para nossa população, e como erro grave de análise, desconsiderei os juros em sua intensidade, valor, que obviamente, por exemplo, são mais altos que os juros de Espanha (menos de 0,8% no período 2014-2018) e Grã-Bretanha (mesmo teto de 0,8%, com valores mais baixos no passado do mesmo período de 2014-2018), com nossos esmagadores valores (de média no mesmo período de uns 10%, piso acima de 6% e teto pelos estratosféricos 14%), e concordo e aceito, juros nominais, mas...

Aqui teríamos de incluir uma inflação para o período 2003-2014 que nunca esteve abaixo de 3% ao ano (o grande período de expansão brutal do crédito - como chamo, o “período Mantega”, “aquele para quem papel paga tudo”). Estes valores nos levam a uma taxa de juros reais, grosseiramente calculando, de uns 3%, o que é uma taxa piso para os juros bastante alta, com o alerta geral (perdão pela ironia infame) de que ninguém no país, com raríssimas e meio anômalas exceções, toma juros a esta taxa anual, basta ver qualquer financiamento mesmo do BNDES, imaginemos o consumidor final em qualquer carnê de lojas de departamento, mas forcemos o argumento.

Essa desproporção necessitaria um fator de correção ao meu análogo de Frank para a pressão do crédito, mas confesso, tal índice ainda não cheguei numa confiança em seu desenvolvimento, então, por hora, fiquemos com um piso de juros reais de 3% dividido por uns caridosos 1% dos demais países, o que dá um multiplicador grosseiro mas ilustrativo para a pressão que o tomador de crédito brasileiro sofre de umas três vezes, desconsiderando aspectos do saldo de pobreza que resta para os demais ítens de consumo (em suma, aquilo que os análogos de pressão fiscal de Frank sempre mostram).

Observe-se que restar ao canadense, por exemplo, metade de sua renda bruta após os tributos corresponde a receber como resposta muito mais do estado do que o que resta ao pobre brasileiro após os seus tributos - o permanente problema do nosso triste retorno dos tributos - mas sabemos que isso sempre foi, na cabeça de nossos governantes, um mero detalhe.


O colapso previsto e inexorável

Lembremos inicialmente que como qualquer consultor em finanças pessoais sempre alerta, os juros são um péssimo gasto. Os juros pagos numa fatura parcelada de cartão de crédito não viram um belo carro, uma bela camisa, sequer um supérfluo perfume ou uma divertida bebida alcoólica para relaxar no final de semana. É um dinheiro para o consumidor, sejamos bem claros, perdido, apenas debitado, e só entra como troca pelo tempo que ele comprou na antecipação da aquisição de um bem ou serviço ou prorrogando um volume maior de mais pagamentos a serem feitos.

O que o período Mantega fez, com expansão de crédito, foi propiciar o consumo dos bens e serviços antecipados a uma mais prudente poupança para o consumidor, destaque-se de mais baixa renda, pior ainda se em algo sem a menor recuperabilidade como turismo, que após consumido não pode ser revendido - não existe o “serviço usado”, não existe o “corte de cabelo “semi-novo”" - e em anomalias como favelado comprando tablet, exemplo mais gritante, que pode ter fomentado a produção industrial (até na China, triste fato para nós, felicidade para eles) durante algum tempo, mas adiante, pela carga de juros acrescentada às costas da população, não tardaria por reduzir seu consumo, ou para compensar um certo volume de inadimplência, e ele e é foi alto, ainda mais carga de juros, acelerando o colapso do ilusório círculo vicioso travestido de virtuoso.

Não havia possibilidade de outro destino, desde o começo.

A pergunta que fica no ar é: Tentarão de novo esta tolice?

(Um título para um já profetizado futuro artigo: “A eterna insistência no vôo de galinhas”)


Mais bocas a mesa, uma anotação rápida

Uma preocupação permanente que os dirigentes brasileiros tem de ter é propiciar (ou, sejamos diretos, ao menos não impedir) um crescimento econômico acima do crescimento vegetativo da população, pois enquanto tivermos, desesperadamente, um crescimento do número de bocas a alimentar acima do crescimento da geração de riqueza da nação, não estaremos produzindo uma população mais rica (e aqui a distribuição pouco interessa como solução, mas inclusive agrava a situação, como vimos, historicamente por inflação, recentemente por juros).

Estaremos, como digo em consultorias de empresas que passaram por forte alavancagem provocando com que a carga de juros sofridos ultrapassem a capacidade de produzir lucro, o efeito tesoura, não crescendo como pinheiro, firme e para o alto, mas crescendo como “rabo de cavalo, que até pode ser bonito, mas ruma ao chão e não situa-se em local muito agradável”.


Uma rápida revisão, retrocedendo ano a ano.

2018

Em 1 ano, aumenta em quase 2 milhões número de brasileiros em situação de pobreza, diz IBGE

Número passou de 52,8 milhões em 2016 para 54,8 milhões em 2017, um crescimento de quase 4%. Já pobreza extrema aumentou 13%, passando a atingir 15,3 milhões.

Daniel Silveira, — 05/12/2018 - g1.globo.com

2017

Entrevista: Brasil pode voltar ao mapa da fome da ONU, diz economista do Ibase - 22/10/2017 - epocanegocios.globo.com

Alta do desemprego, o avanço da pobreza, o corte de beneficiários do Bolsa Família e o congelamento de gastos públicos contribuem para aumento da fome no país

2016

Depois de 13 anos de PT, Brasil tem 73 milhões de pobres (36% da população) -- CLÓVIS ROSSI, na FOLHA - 22/05/2016 - www.noticiasagricolas.com.br

“Depois de pouco mais de 13 anos de governo do PT, o partido que sempre se considerou o paladino dos pobres, o Brasil conta com 73.327.179 pessoas pobres -o que dá cerca de 36% de sua população total.

Não sou eu quem o diz, mas o sítio oficial do Ministério de Desenvolvimento Social de Dilma Rousseff, ao informar sobre o Cadastro Único para Programas Sociais, que "reúne informações socioeconômicas das famílias brasileiras de baixa renda -aquelas com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa".

Famílias de baixa renda é um piedoso eufemismo para pobres ou, até, para miseráveis, conforme se pode ver quando se separam os cadastrados por faixa de rendimento: de R$ 0 até R$ 77 -38.919.660 pessoas;
de R$ 77,01 até R$ 154 -14.852.534; de R$ 154,01 até meio salário mínimo -19.554.985.

O total é um estoque infernal de miséria e pobreza. Pode até haver mais, porque o cadastro inclui 7,8 milhões de pessoas que ganham mais que meio salário mínimo. Mas não especifica quanto mais.

O estoque existente em janeiro de 2015, a data mencionada no sítio do ministério, torna suspeita a propaganda petista segundo a qual 45 milhões de pessoas deixaram a pobreza nos anos Lula/Dilma.”


Referências


PIB cresce 0,5% em 2014 chega a R$ 5,8 trilhões - 17/11/2016 - agenciadenoticias.ibge.gov.br

“O PIB chegou a R$ 5,779 trilhões em 2014 e o seu crescimento em relação a 2013 foi revisado de 0,1% para 0,5%. O PIB per capita (R$ 28.498) teve queda de 0,4% em relação a 2013. Foi a terceira queda nesse indicador desde o ano 2000, sendo que os recuos mais recentes ocorreram em 2003 (-0,2%) e 2009 (-1,2%).”

População do Brasil chega a 207,7 milhões de pessoas em 2017, segundo o IBGE - 30/08/2017 - ultimosegundo.ig.com.br

“Pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgada nesta quarta-feira (30) indica que o Brasil tem 207,7 milhões de habitantes e uma taxa de crescimento populacional de 0,77% entre 2016 e 2017. Apesar de haver uma elevação na população, houve desaceleração em relação ao ano anterior. Na comparação de 2016 com 2015, a taxa de crescimento populacional foi de 0.8%.”

Efeito tesoura: o que é e quais são suas causas - 07 de abril de 2016 - www.asaas.com

“O que é o efeito tesoura?

O conceito, desenvolvido pelo francês Fleuriet na década de 70, baseia-se no fato de uma empresa precisar de capital de giro cada vez maior e dispor de um saldo em tesouraria cada vez menor, negativo. O nome efeito tesoura vem da forma como as linhas do gráfico dessa relação ficam dispostas: como uma tesoura aberta.”

Contas do setor público têm primeiro déficit da história em 2014 - Alexandro Martello - 30/01/2015 - g1.globo.com

No ano passado, foi registrado déficit primário de R$ 32,53 bilhões, diz BC.
Após pagar juro, resultado é um dos piores do mundo e dívida pública sobe.

Pressões econômicas - Scientia

Uma rápida análise das proporções entre carga tributária e renda, expressa pelo PIB per capita, e por similaridade, a proporção entre volume de crédito e renda.

“Percebe-se que nos países apresentados, já ocupávamos a segunda posição em 2008, e em 2012, passamos à primeira posição, sendo que todos os países aí mostrados tem um PIB per capita pelo menos mais de 3 vezes o nosso. O problema é de tal monta que novamente repetimos que imprecisões, fontes desatualizadas e flutuações oriundas de erros até significativos não alteram a análise.”

Espanha - Taxa De Juro - pt.tradingeconomics.com

Reino Unido - Taxa De Juro - pt.tradingeconomics.com  

Entenda as metas de inflação e seu papel na economia - 09/01/2015 - g1.globo.com  



Renúncia Tributária – Juros Excessivos – Déficit Nominal – Ajuste Fiscal – Depressão – Déficit Primário - Fernando Nogueira da Costa in Conjuntura Econômica  23/02/2016 - fernandonogueiracosta.wordpress.com


Leituras recomendadas

Uma recomendação de leitura rápida e didática, ainda que, ao meu ver, com os vícios de esquecer que o problema não é apenas distribuição da riqueza bruta, uma não muito eficiente apenas redução da desigualdade, mas brutal (repetição necessária) geração de riqueza per capita, o velho e distorcido “fazer o bolo crescer antes de dividí-lo”.

Mas neste texto, aponta-se um tema permanente de meus estudos: somos uma sociedade extremamente improdutiva para os parâmetros atuais do “turbo-capitalismo”, e sofreremos gravemente adiante com as ondas de choque na nova revolução industrial, onde pouco importará baixo custo da mão-de-obra, e o clássico problema de Adam Smith (da permanente oferta da mão-de-obra) enfrentará fortes mudanças de paradigmas.

Felippe Hermes - Afinal, por que é que o Brasil nunca deixa de ser pobre? - super.abril.com.br
Spoiler: porque o único caminho para enriquecer é diluir a concentração de poder político-econômico. E o que fazemos é justamente o contrário


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